Introdução
"A falta de respeito, embora pareça menos agressiva do que um insulto manifestado, pode assumir formas igualmente ofensivas. Insultos não são desferidos à outra pessoa, porém, tampouco se confere a ela qualquer reconhecimento. A pessoa em questão não é vista – como um ser humano pleno, cuja presença tem valor.
Quando uma sociedade trata a sua massa populacional desta forma, concedendo reconhecimento apenas a um seleto grupo de privilegiados, gera escassez de respeito, como se esta preciosa substância não estivesse disponível em quantidades suficientes para todos. Assim como na maioria dos casos de fome, essa escassez é produzida pelo homem; mas ao contrário dos alimentos, o respeito não custa nada. Então o que justifica tal escassez?”
Richard Sennett, Respeito: A Formação do Caráter em um Mundo Desigual
A cidade é imaginada como um lugar onde todos compartilham respeito em meio à diferença. Ela é frequentemente descrita com uma criação físico-cultural coletiva, na qual um padrão mínimo de relações sociais permite que pessoas muito diferentes umas das outras possam conviver relativamente em paz.
No entanto, as cidades são ainda espaços onde há acumulações extremas de riqueza e condições de extrema pobreza. A forma espacial urbana resultante caracteriza-se pela existência de vastos fossos que separam espaços excessivamente providos de infraestruturas e comodidades, de outros deliberadamente ignorados pelos órgãos públicos e privados.
Cidades no mundo inteiro perderam a fé na capacidade urbana de produzir respeito. Isto manifesta-se de forma patente no aumento do medo urbano bem como da pobreza urbana. Há uma proliferação de condomínios fechados e espaços privados com arrojados sistemas de segurança, de propriedade dos ricos e para os ricos, que vivem eternamente com medo do "outro" urbano. Por outro lado, observa-se uma disponibilização insuficiente de terreno e moradia para os novos imigrantes e pobres urbanos, bem como a existência, dentro da cidade, de extensões territoriais que escapam ao controle do estado.
Se a cidade deve ser pensada como um sistema, um espaço, uma realidade social capaz de produzir as condições necessárias para que haja respeito em meio à diferença, onde podemos ver tal cidade nos dias de hoje? Na atual época da privatização em massa do espaço e da vida públicos, onde pode um público urbano garantir sua sustentabilidade material e cultural? Nos dias de hoje, onde estão os espaços públicos nos quais as pessoas podem coabitar e produzir uma cidade de respeito?
O respeito como ação, condição, relação social difere do conceito histórico de "respeitabilidade", segundo o qual corpos de determinada classe social, raça, gênero e aptidão física sempre gozaram do privilégio de serem considerados "respeitáveis", por atenderem a certos códigos de aparência. Na nossa acepção, respeito também não significa reverência acrítica nem acato a instituições de poder ou de privilégio, que por sinal, podem até ser agentes produtores de desrespeito estrutural. Este Desafio propõe que se pense além das noções familiares de respeito pela autoridade, pelos mais velhos ou pelo poder – e que, em vez disso, se considerem essas mesmas noções como malhas de uma rede coletiva de desrespeito. Com sua longa história de convívio não só com a diferença, mas também dentro e por meio dela, o Rio de Janeiro, que está vivendo um momento de intensa transformação urbana e política, é um canteiro urgente de considerações sobre como Projetar para o Respeito.
Este concurso quer que terrenos, arquiteturas, infraestruturas sociais ou físicas em todo a cidade do Rio de Janeiro sejam reimaginados como espaços para lutar, defender ou produzir novas condições de respeito dentro do contexto da superdiversidade da metrópole do século 21. Contudo, o projeto em si não será o produto final. Ele pode ser o meio através do qual se construirão relações comunitárias ou urbanas, espaços e organizações.